Sol, samba no pé e muita alegria. O carnaval 2017 de Guarapari trouxe diversão e movimentou a cidade em um momento complicado da economia nacional.
O carnaval celebrou também o fim da greve da Polícia Militar. Durante o mês de fevereiro, a PM se aquartelou e a desordem tomou conta das ruas capixabas. Em Guarapari, a Avenida Joaquim da Silva Lima, onde são realizados os desfiles das escolas de samba e dos blocos de carnaval, foi palco de cenas de vandalismos e tiroteio.
Com a chegada da Força Nacional de Segurança ao Estado, no dia 08 de fevereiro, uma discussão foi realizada pelos prefeitos: manter o carnaval ou suspender os festejos que se aproximavam?
O recém-empossado Edson Magalhães foi o primeiro prefeito a se manifestar a favor da manutenção das festas de rua. A decisão de Edson foi arriscada, mas com o fim da greve da PM e seu retorno às ruas, Guarapari recebeu um grande público.
Além das belezas naturais, a cidade ofereceu aos visitantes um desfile de escolas de samba, blocos carnavalescos e apresentações de bandas de marchinhas de carnaval.
A Avenida Joaquim da Silva Lima, no Centro da cidade, se transformou no corredor da folia, com o tradicional carnaval da família. A prefeitura colocou separadores de público ao longo da via, para separar os espectadores de quem desfilava.
Um palco também foi montado no meio da avenida, de onde os locutores anunciavam as agremiações. Ao final de cada desfile, todos os foliões eram convidados a brincar na avenida, momento conhecido como “pipoca”. No centro, se apresentaram 8 blocos e 4 escolas de samba entre os dias 25 e 28 de fevereiro, sempre a partir das 20 horas. Na Praia do Morro, o carnaval contou com o desfile da banda de marchinhas, comandado pelo Maestro Mauro, sempre com início a partir das 18h.
A prefeitura de Guarapari comemorou o sucesso do carnaval. Em matéria oficial publicada no site da prefeitura com o título: Guarapari comemora o sucesso do carnaval 2017. O vice-prefeito Miguel Agrizzi, que ocupava o cargo de secretário de Turismo, disse: “Nós tivemos um lindo carnaval, um ambiente familiar, foi um carnaval de muita alegria. No ano que vem vamos melhorar ainda mais a nossa estrutura.”
O que a população de Guarapari e os muitos turistas capixabas não perceberam é que um verdadeiro festival de irregularidades foi cometido durante o período do carnaval. O clima festivo e a necessidade de movimentar a economia da cidade criaram um ambiente propício para que agentes públicos desviassem parte do recurso licitado pela prefeitura.
A festa que ninguém viu: os fatos
A prefeitura de Guarapari, no ano de 2016, realizou duas licitações para o carnaval de 2017. Mas a decisão sobre homologar (confirmar) ou não a licitação ficou para o prefeito eleito Edson Magalhães.
A primeira licitação foi referente à organização do carnaval no centro de Guarapari, para as despesas com a equipe de organização e os cachês das escolas e blocos da cidade. A empresa vencedora foi a AFR Eventos, com o valor de R$368.000,00, sendo que R$237.000,00 deveriam ser repassados para as escolas e blocos organizarem seus desfiles.
A segunda licitação foi referente às estruturas do carnaval do Centro, da Praia do Morro e do evento Fitness e englobava palco, sonorização, luz e separadores de público. Essa segunda licitação foi feita com três lotes.
Por decisão do prefeito eleito Edson Magalhães apenas a primeira licitação, que teve como vencedora a empresa AFR Eventos, foi mantida. A segunda licitação foi cancelada.
As irregularidades
Com a decisão tomada por Edson Magalhães de cancelar a segunda licitação, a prefeitura teria que realizar uma nova licitação para poder pagar toda a estrutura de palco, separadores de público, sonorização e iluminação. A equipe do Portal Realidade Capixaba pesquisou e não encontrou nenhum documento da prefeitura referente a uma nova licitação para o carnaval.
Durante a pesquisa para a realização dessa matéria nossa equipe foi procurada por um funcionário da prefeitura que forneceu informações dos bastidores do carnaval de Guarapari. “A prefeitura só homologou a primeira licitação porque a vencedora foi a AFR Eventos que é uma empresa próxima ao prefeito. A AFR Eventos foi doadora de campanha de Edson Magalhães em 2014, quando ele se elegeu deputado e nas eleições de 2012 e 2016 a AFR declarou valores inferiores ao encontrado no mercado com o objetivo de mascarar as doações feitas. Basta verificar a declaração de campanha de Edson sobre o aluguel do trio elétrico e os valores declarados”, disse o funcionário da prefeitura.
Nossa equipe pesquisou e encontrou notas fiscais que comprovam a relação de Edson Magalhães com a empresa AFR Eventos.
Segundo o funcionário da prefeitura a segunda licitação foi cancelada e a AFR acabou fornecendo toda a estrutura necessária sem que uma nova licitação fosse realizada. Para pagar a empresa, as escolas de samba e os blocos tiveram que devolver parte dos cachês licitados”, informou o funcionário que pediu para não ser identificado.
Com base nessas informações nossa equipe procurou representantes das escolas de samba e dos blocos que confirmaram a informação de que foram coagidos pelo vice-prefeito a ‘abrir mão’ de parte dos cachês. “Nós tivemos que abrir mão dos cachês porque a prefeitura informou que não tinha dinheiro para custear o carnaval e ameaçou cancelar a festa. A reunião com o vice-prefeito foi tensa e no final todos assinaram um documento que foi encaminhado ao prefeito com a aceitação de que por conta da crise os valores seriam reduzidos. As escolas de samba tiveram que abrir mão em média de R$15.000,00 cada, e os blocos devolveram R$2.000,00 cada”. Disse o representante de uma escola de samba.
Nossa equipe teve acesso ao documento que foi assinado pelos representantes das escolas de samba, dos blocos e pelo vice-prefeito, e que foi encaminhado ao prefeito Edson Magalhães. O documento diz que as agremiações aceitavam reduzir os valores dos cachês. Mas, com a informação de que o valor pago à empresa AFR Eventos foi integral, os representantes dos blocos ouvidos pela nossa equipe suspeitaram de desvio do dinheiro. “Nós fomos enganados. Disseram que o valor tinha que ser reduzido por conta da crise, mas se a empresa não devolveu o dinheiro para a prefeitura deveria ter repassado para os blocos.” Disse o representante de um dos blocos.
Nossa equipe foi informada de que o vereador Lennon Monjardim também participou da reunião em que foi decidida a redução no valor dos cachês. Em nota, o vereador informou que os valores foram reduzidos a pedido da prefeitura e que vai solicitar informações sobre o ocorrido. “Sou o primeiro a querer que tudo seja esclarecido. O carnaval de Guarapari é feito com muito sacrifício por todos. Os desfiles movimentam a economia da cidade e não vou permitir que prejudiquem o nosso carnaval. Vou solicitar a prefeitura cópia do contrato e dos valores repassados.” Disse o vereador.
Para a realização dessa matéria nossa equipe enviou os seguintes questionamentos à prefeitura de Guarapari:
1- Como foi contratada a estrutura (palco, separador de público, sonorização e iluminação) para a realização do carnaval do Centro da cidade?
2- Como foi contratada a estrutura (palco, separador de público, sonorização e iluminação) para a realização do carnaval da Praia do Morro?
3- Como foi contratada a estrutura (palco, separador de público, sonorização e iluminação) para a realização do evento Fitness?
4- Recebemos uma denúncia de que as escolas de samba foram coagidas a devolverem parte do cachê com o objetivo de custear a empresa AFR Eventos. Essa informação é de conhecimento da administração?
5- Qual a relação que existe entre a empresa AFR Eventos e o primeiro escalão da administração municipal?
6- Por que as cópias dos processos e contratos não receberam a publicidade obrigatória por lei?
7- Por que a prefeitura de Guarapari se recusa a encaminhar as cópias de todos os contratos envolvendo o Carnaval de Guarapari para a Câmara de Vereadores conforme solicitação feita pelo vereador Dr. Rogério?
8- A administração municipal está realizando alguma auditoria ou investigação interna que envolva eventos ou shows organizados pela administração no ano de 2017?
9- O prefeito Edson Magalhães pode comentar a respeito das irregularidades encontradas por nossa equipe nos contratos e procedimentos para a realização do carnaval de Guarapari?
Essa reportagem faz parte de uma série de matérias especiais que o Portal Realidade Capixaba está publicando sobre desvio de recursos públicos na realização dos eventos na cidade de Guarapari. Na próxima quinta-feira, 14 de dezembro, vamos publicar uma nova matéria com o título: Matéria Especial: irregularidades se repetem na Esquina da Cultura
Relembre as matérias:
Valor dos cachês de shows chama atenção em Guarapari
Matéria Especial: Suspeita de superfaturamento em Guarapari
Matéria Especial: Áudio comprova extorsão contra empresários dentro de prefeitura capixaba